Páscoa
Nesse clima de páscoa, me lembrei de quando era criança e sempre passávamos as páscoas em Diamantina. Lá, há procissão no domingo de Páscoa, e as ruas de pedra são pintadas com areias coloridas formando um tapete para a procissão. Este era o ponto alto da minha páscoa (e o chocolate, claro!).
Íamos sempre pelo menos eu e meu pai, mas lembro-me de um ano em que foram também minha mãe e irmã, meus avós e alguns primos. Quem me conhece já a algum tempo já deve ter percebido que noção é algo que sempre faltou ao meu pai. Ele é uma pessoa extremamente exagerada, principalmente quando se trata de comida. Seu lema sempre foi "é melhor sobrar do que faltar", o que com certeza me influenciou e fez com que eu sempre exagere nos comes quando recebo amigos.
Então estávamos lá, eu, minha irmã e meus primos. Para mim, que fui criada em apartamento e nunca pude brincar na rua, nem andar pelas ruas sozinha, Diamantina era um universo paralelo. Lá, eu podia sair de casa sozinha quando bem entendesse, eu conhecia os arredores de casa melhor que a palma da minha mão, conhecia filhos e netos de amigos do meu pai com quem podia brincar. É engraçado perceber que hoje já não lembro mais de nenhum dos nomes dessas pessoas, apesar de ainda lembrar-me das fachadas de suas casas. E eu, como sempre divagando em outra direção. O assunto, era aquela páscoa.
Brincamos muito, corremos pela cidade, assistimos a partida da procissão da paixão de Cristo na sexta, com os homens vestidos de soldados romanos levando o Cristo para a cruz que em seu trajeto passavam ao lado da nossa casa. A lembrança dos passos ritmados com as lanças batendo nas ruas de pedras ainda durará um bom tempo em minha memória. Por algum motivo nunca seguimos a procissão, apesar da minha curiosidade de saber o lugar do seu final... A procissão da sexta era uma procissão triste, fúnebre, que levava o Cristo para a morte e ela despertava em mim um certo medo, mesmo que eu soubesse que era apenas uma encenação. Era a encenação de algo triste e trágico, e isso me afetava um pouco.
Aí vinha o sábado com mais brincadeiras e comidas e logo a tristeza da sexta era esquecida. E começava a antecipação pelo domingo. O dia de brincar com as areias coloridas e o dia do CHOCOLATE!!!! Ainda lembro do pó Xadrez usado para colorir a areia. A pintura começava cedo na manhã de domingo, e se bem me recordo, a procissão passava lá pela hora do almoço. Neste domingo em especial, voltamos para casa com as mãos (e as roupas) todas manchadas, as mão já pretas pela mistura das diferentes cores, prontos para almoçar e ganhar nossos ovos.
Como eu disse, falta muitas vezes falta bom senso ao meu pai, e para cinco crianças, ele simplesmente entregou uma caixa de ovos de páscoa, provavelmente de uns 300g cada um. Ele entregou-nos a caixa de ovos fechada, sem qualquer instrução de que deveríamos guardar os ovos nem comê-los aos poucos. Então, nós devoramos todos aqueles ovos no intervalo entre o almoço e a hora de voltar para Belo Horizonte, o que não deve ter sido muito mais que uma hora.
Aí vem a lembrança mais forte que guardo dessa viagem, os dois carros em comboio voltando para casa cheios de crianças passando mal, com dor de barriga, e a necessidade de diversas paradas para irmos ao banheiro neste trajeto. E é claro que chegando em casa e ganhando ovos de páscoa de outros tios, logo esqueci desse acidente e os devorei sem demora.